Editoria Ponto Digital
27.08.2019
O artista português Tiago Cadete conta as referências que o ajudaram a criar “Alla Prima”, trabalho que reflete sobre a brasilidade a partir da projeção de imagens e citações no corpo nu do bailarino, o qual traduz as ideias com movimentos. O nome surge da expressão italiana que significa “de primeira”, termo utilizado para se referir a uma técnica de pintura do século XVII na qual a tinta é aplicada sem estudos preparatórios ou esboços. Tiago transforma sua pele em suporte, obtendo, assim, um resultado sem retoques.
O trabalho é dividido em três partes. A primeira é composta por citações “com aspas muito grandes”, segundo Tiago, porque “corremos o risco de estarmos desatualizados, uma vez que esse Brasil representado muda todos os dias e está sempre em construção”. Depois, há descrições orais detalhadas das imagens apresentadas e, por último, Tiago as traduz com o movimento do corpo.
Ele conta que um episódio durante o trabalho com o coreógrafo Francisco Camacho foi importante para a criação da argumentação da performance. “Havia uma cena difícil de executar. O grupo ensaiou por uma semana e depois ficou um mês sem fazer, então criava uma ansiedade. Um dia o Francisco chegou e disse ‘vamos fazer aquela cena que não fazemos há muito tempo’, e ela aconteceu como se tivéssemos trabalhado diariamente. Digo isso para explicar a escuta que faço em ‘Alla Prima’. Na construção do pré-ensaio, coloco uma pessoa em frente a imagem sem nenhuma informação prévia. Outras partes eu não ensaio antes. Assim meu corpo nunca se torna um artifício. É no estudo ao vivo que o trabalho acontece”.
Mas foi a obra “Brasil Nativo, Brasil Alienígena” da artista plástica Anna Bella Geiger a maior referência de Tiago. Em uma série de nove cartões-postais de divulgação da cultura indígena, Geiger aparece nas fotos mimetizando gestos cotidianos de mulheres e homens indígenas a refletir sobre a identidade brasileira.
A nudez do coreógrafo Wagner Schwartz em “La Bête” também influenciou o bailarino português. “Eu tratava tudo de forma estereotipada, pintava a cara, tinha um cocar de penas, mas eu via os ensaios e achava isso ridículo, porque eu não queria ser isso. A partir do trabalho do Wagner passei a não utilizar esses paramentos”, diz. A condição humana para o artista é, por fim, ter desejos sobre o que não se conhece, não para dominar, mas para entender. “Criar a ideia de pureza de um território é ingênuo”.
Composta por 6 episódios, a web série traz entrevistas com artistas que apresentaram trabalhos autorais Bienal Sesc de Dança 2017. O projeto foi idealizado por Cláudia Müller, artista e pesquisadora de dança, e realizado em parceria com a equipe de Comunicação do Sesc Campinas.
Texto: Lizandra Perobelli, Estagiária de Comunicação – Sesc Campinas.
Edição: Fernando Bisan, Editor web – Sesc Campinas.